Uso recreativo de opióides durante a pandemia de SARS-CoV-2 resultou em um aumento de casos de abuso e dependência dessas substâncias
Antônio Pereira Ribeiro Arantes, Christopher Santos Silva, Ericke Cardoso Oliveira, Gabriel Rodrigues Caldas Souza Aguiar, João Paulo Ribeiro Delfino, Júlia Lopes Granato, Maria Eduarda Souza, Vinicius Marx Silva Delgado
Graduandos do curso de Bioquímica (UFSJ-CCO)
v.2, n.4, 2024
Abril de 2024
A história dos opióides remonta à antiguidade e estas substâncias são reconhecidas como parte do grupo das mais antigas drogas do mundo, envolvendo compostos com princípios ativos farmacológicos usados com finalidade de tratamento. O uso recreativo desses compostos derivados, que são derivados da papoula (Figura 1), remonta a períodos anteriores à história documentada [1].
Os opióides têm suas funções químicas amplamente documentadas na atualidade, e sua ação mais comum está associada à analgesia, proporcionando efeito analgésico [2]. Recentemente, durante a pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2, o aumento das prescrições médicas para uso de opióides e o uso recreativo de medicamentos à base destes acentuaram um problema de saúde pública, suscitando um debate relevante na área da saúde [3].
O uso de opióides, como o fentanil, já foi recomendado no tratamento de infecções para melhorar as condições clínicas dos pacientes, possibilitando uma resposta mais eficaz do sistema imunológico [3]. A sensação de analgesia proporcionada pelo fentanil se comparada à da morfina é de 50 a 100 vezes mais potente [4]. No entanto, o uso recente deste medicamento tem se tornado recreativo, especialmente nos Estados Unidos, onde o fentanil tornou-se um grave problema.
Figura 1: Papaver somniferum, a papoula.
Por décadas, os americanos tem enfrentado uma epidemia de dependência de opióides, como morfina, heroína e Vicodin, que persiste como problema de saúde pública. Atualmente, o fentanil representa uma ameaça significativa. Somente em 2022, durante o auge da pandemia, mais de 110 mil pessoas perderam a vida devido ao medicamento [4]. Isso ressalta o impacto significativo da pandemia no aumento indesejado e sem controle do uso dessa substância. O número de mortes em 2022 em comparação com 2021 teve um aumento de 2%, enquanto em relação a 2020, o aumento foi de 30%. Existe também aumento dos de overdose causadas pelo medicamento neste intervalo de tempo. Porém, destaca-se acentuado número de casos na transição 2020/2021 e sua persistência no pós-pandemia [4].
Devido à alta potência do fentanil, mesmo em doses terapêuticas, a linha entre ovalor considerado dose terapêutica e a dose fatal é tênue, principalmente devido ao alto efeito do medicamento ocasionando redução nos estímulos enviados ao sistema respiratório [5]. A pouca dificuldade de obtenção da substância, tanto legal quanto ilegalmente, facilita que a população possa se envolver profundamente no consumo de opióides.
O uso intenso de analgésicos no cotidiano dos americanos, devido à ausência de um sistema público de saúde robusto, expõe problemas enfrentados pelas autoridades [4]. A venda ilegal e a produção fácil, aliadas à atração de cartéis e traficantes, colaboram para uma abundância de oferta da droga. A rápida dependência causada pelos opióides agrava ainda mais a situação, tornando os Estados Unidos o maior mercado consumidor destas drogas [6].
A situação preocupa até mesmo as autoridades brasileiras, que vislumbram a possibilidade de a problemática se estender ao Brasil [6]. Para os profissionais da saúde, os desafios em combatê-la envolvem diversas abordagens, pois trata-se de uma situação de lidar com vícios. Parcerias e esforços conjuntos estão sendo desenvolvidos, combinando abordagens químicas em busca de tratamentos abrangentes, intervenções psicológicas para promover a compreensão e aceitação do paciente em relação à necessidade de ajuda, e, fundamentalmente, políticas públicas educacionais [7]. Informar a população sobre os perigos do uso recreativo é crucial, destacando a importância de um profissional de saúde para orientar quando o uso clínico do fármaco for realmente necessário.
Referências Bibliográficas
[1] - Duarte DF. Uma breve história do ópio e dos opióides. Revista Brasileira de Anestesiologia, v. 55, n. 1, p. 135–146, 2005.
[2] - Álvarez Y, Farré, M. Farmacología de los opioides. Adicciones v. 17, n.2, p.21-40, 2005.
[3] Paraná. Analgesia, sedação e Bloqueio Neuromuscular na Pandemia COVID-19. Disponível através do link: <https://www.saude.pr.gov.br/sites/default/arquivos_restritos/files/documento/2021-03/Protocolo%20seda%C3%A7%C3%A3o%2C%20analgesia%2C%20bnm.pdf>. Acesso em: 09 abr. 2024.
[4] Brasil de Fato. Crise dos opióides nos EUA: entre a guerra às drogas e a redução de danos. Disponível através do link: <https://www.brasildefato.com.br/2023/10/17/crise-dos-opioides-nos-eua-entre-a-guerra-as-drogas-e-a-reducao-de-danos>. Acesso em: 09 abr. 2024.
[5] José DR et al. Estudo Experimental no Cão. Disponível através do link: <https://www.bjan-sba.org/article/5f9d82f98e6f1adf058b45dc/pdf/rba-26-1-56.pdf>. Acesso em: 09 abr. 2024.
[6] Zanotti M. Voracidade dos lucros e a “epidemia dos opióides” nas Américas. Disponível através do link: <https://www.ihu.unisinos.br/categorias/627883-voracidade-dos-lucros-e-a-epidemia-dos-opioides-nas-americas>. Acesso em: 09 abr. 2024.
[7] Global. Cerco ao fentanil: Anvisa restringe substâncias usadas na produção ilegal da droga. Disponível através do link: <https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2023/03/cerco-ao-fentanil-anvisa-restringe-substancias-usadas-na-producao-ilegal-da-droga.ghtml>. Acesso em: 09 abr. 2024.