Síndrome de Knobloch: o mapeamento genético que a desvendou
Anna Flávia Candido¹, Camile Araújo¹, Julia Rodrigues Barros¹, Kaique Bruno da Silva Paixão¹, Luiza Cristina¹, Mariana Almeida¹, Maria Vitória¹, Nayara Ferreira¹, Yago Nunes²
¹Graduandos do curso de Bioquímica (UFSJ-CCO)
²Graduando do curso de Medicina (UFSJ-CCO)
v.1, n.2, 2023
Outubro de 2023
A síndrome de Knobloch (SK), é uma doença genética rara de herança autossômica recessiva, isto é, ocorre por alterações indesejadas, chamadas de mutações, na sequência de nucleotídeos (os blocos de construção do ácido desoxirribonucleico (DNA)) que se localizam no núcleo das células humanas. E para manifestar a doença o indivíduo, no caso da doença classificada como autossômica recessiva, necessariamente precisa herdar o DNA mutado dos dois genitores [1] .
Os sintomas da síndrome manifestam-se como um grau elevado de miopia, degeneração vitreoretinal (destruição nas áreas dos olhos chamadas vítreo e retina, causando o deslocamento desta última) (Figura 1), dentre outras anomalias que interferem na formação da visão normal.
A doença foi descrita pela primeira vez por Knobloch e Layer em 1971, quando foi feito um estudo genealógico em uma família acometida por problemas de visão grave, que depois veio a descobrir-se serem causados pela SK [3].
Sua prevalência (número de casos em dada população em dado momento no tempo) é estimada atualmente em cerca de 1 caso a cada 1 milhão de nascidos, tendo menos de 100 casos sido relatados até o ano de 2020 [2] .
Figura 1: Representação gráfica de corte transversal de um olho humano, mostrando um descolamento de retina na parte superior da imagem.
Fonte: Erin Silversmith ,2010 – Imagem de Wikimedia Commons
Para se determinar qual eram as alterações no DNA que ocasionavam a Síndrome, o chamado mapeamento genético foi realizado pela professora e pesquisadora Mayana Zatz, atualmente atuando no Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da USP e também como coordenadora do Centro de Pesquisas sobre Genoma Humano e Células-Tronco em conjunto com as professoras Maria Rita Passos-Bueno e Eloísa de Sá Moreira. Este mapeamento foi realizado pela primeira vez em meados da década de 90 sob coordenação de Zatz. [6].
O processo de mapeamento genético foi feito em uma família brasileira composta por 12 integrantes que aparentemente possuiam o DNA mutado, pois apresentavam quadros característicos da SK. Primeiramente é necessário ter-se em vista que a mutação é localizada a nível celular, ou seja dentro de uma célula, especificamente em um gene (que é um segmento do material genético DNA contendo informação que será herdada pela geração futura). Este gene por sua vez fica localizado em um arranjo de DNA chamado cromossomo. Uma célula humana normal contém 23 pares de cromossomos, responsáveis por abrigar os genes, segmentos de DNA, que armazenam as informações acerca de quem somos geneticamente. Os cromossomos podem conter milhares de genes, que são responsáveis por determinar várias características do corpo humano[11].
Para se determinar qual eram as alterações no DNA que ocasionavam a Síndrome, o chamado mapeamento genético foi realizado pela professora e pesquisadora Mayana Zatz, atualmente atuando no Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da USP e também como coordenadora do Centro de Pesquisas sobre Genoma Humano e Células-Tronco em conjunto com as professoras Maria Rita Passos-Bueno e Eloísa de Sá Moreira. Este mapeamento foi realizado pela primeira vez em meados da década de 90 sob coordenação de Zatz. [6].
O processo de mapeamento genético foi feito em uma família brasileira composta por 12 integrantes que aparentemente possuiam o DNA mutado, pois apresentavam quadros característicos da SK. Primeiramente é necessário ter-se em vista que a mutação é localizada a nível celular, ou seja dentro de uma célula, especificamente em um gene (que é um segmento do material genético DNA contendo informação que será herdada pela geração futura). Este gene por sua vez fica localizado em um arranjo de DNA chamado cromossomo. Uma célula humana normal contém 23 pares de cromossomos, responsáveis por abrigar os genes, segmentos de DNA, que armazenam as informações acerca de quem somos geneticamente. Os cromossomos podem conter milhares de genes, que são responsáveis por determinar várias características do corpo humano[11].
Figura 2: Representação gráfica de bandas e bandas do cromossomo humano de número 21.
Fonte: 2017 – Imagem de Wikimedia Commons
Por meio de várias análises foi localizado o cromossomo 21 como sendo aquele contendo a mutação associada à SK. Logo, este foi o cromossomo analisado pelas pesquisadoras para localizar o sítio da mutação[1]. O cromossomo, como já mencionado, possui mais de um gene e o mapeamento do de número 21 foi útil para se identificar qual destes era o gene
mutado que causava a SK. Concluiu-se que o problema encontrava-se na região 21q22.3 (leia-se cromossomo 21, no braço q do cromossomo - que é o braço longo, na região 2, na banda 2 e na sub-banda número 3 [5])(Figura 2) [1].
O gene afetado pela mutação, chamado COL18A1 (NCBI Gene ID: 80781 [10]), está associado à produção de uma porção de uma proteína chamada colágeno. Esta porção é chamada cadeia alfa e o colágeno do qual ela faz parte é dito colágeno do tipo XVIII. Esta proteína faz parte da retina, atuando na estruturação e estabilização da mesma; atua também no fechamento do tubo neural (estrutura que nos bebês durante a gestação (embriões) origina o sistema nervoso central, que mais tarde formará a medula espinhal e o encéfalo[12]). A mutação consiste na inativação, ou seja, na parada de funcionamento deste gene como fonte de informação para a síntese da importante proteína; tudo isto como consequência de alteração dos nucleotídeos do DNA (mutação) [1].
Com a inativação do gene, cessa então a produção da proteína colágeno importante para manter a retina assentada no local correto. Logo, indivíduos que sofrem de SK sofrem, por exemplo, com o descolamento dela. Esta mutação é prejudicial também para outros eventos no embrião como abordado previamente[1].
O diagnóstico dos indivíduos afetados pela síndrome é feito por meio da tomografia computadorizada e ressonância magnética, após perceber-se alterações oculares ou craniais [9]. Estas alterações levam a prever-se que em pouco tempo os sintomas serão ainda mais graves e invasivos, podendo levar à cegueira uma pessoa ainda jovem [2].
A estratégia de tratamento é coordenada por um especialista da área oftalmológica visto que há uma vasta gama de ocorrências e sintomas na área da retina e do encéfalo. No caso do descolamento da retina, por exemplo, pode-se fazer uma cirurgia de reposicionamento, utilizar-se terapia fotodinâmica, entre outros métodos. [2]
O mapeamento realizado pelas pesquisadoras brasileiras foi de grande importância para a precisão de diagnóstico e oferecimento da possibilidade de realização de testes genéticos para calcular-se o risco de transmissão entre indivíduos portadores da mutação causadora da síndrome antes de decidirem ter filhos. Logo, as famílias compostas por indivíduos portadores possuem a possibilidade de receber este atendimento, tanto visando diagnóstico precoce quanto aconselhamento genético. Quanto ao diagnóstico, a SK pode então ser evidenciada precocemente permitindo a melhor abordagem terapêutica para o indivíduo [2].
Referências Bibliográficas
[1] Sertié, AL. Síndrome de Knobloch: do mapeamento genético à clonagem posicional. Disponível através do link: https://repositorio.usp.br/item/001101864 . Acesso em: 01 out. 2023.
[2] Caglayan, PA. ORPHA:1571. Disponível através do link: https://www.orpha.net/consor/cgi-bin/Disease_Search.php?lng=EN&data_id=1722. Acesso em: 01 out. 2023.
[3] Sertié, AL. Síndrome de Knobloch: é causada por um gene de desenvolvimento? Disponível através do link: https://bv.fapesp.br/pt/bolsas/85581/sindrome-de-knobloch-e-causada-por-um-gene-de-desenvolvimento/. Acesso em: 01 out. 2023.
[4] Correa, LMA. Estudo da região promotora do Gene do Colágeno XVII Humano. Disponível através do link: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/41/41131/tde-14092007-161305/publico/Lucia_Armelin_Correa.pdf. Acesso em: 01 out. 2023.
[5] Liga Acadêmica de Genética Médica (LAGeM). Você sabe ler um gene? Disponível através do link: https://www.lagemufma.com/post/2014/11/22/voc%C3%AA-sabe-ler-um-gene#:~:text=Assim%2C%20na%20nota%C3%A7%C3%A3o%20de% 20um,ponto)%2C%20sub%2Dbanda. Acesso em: 01 out. 2023.
[6] Lemos, S. Primeiro sequenciamento do genoma, 20 anos atrás, representou um marco no estudo da genética. Disponível através do link: https://jornal.usp.br/atualidades/primeiro-sequenciamento-do-genoma-20-anos-atras-representou-um-marco-no-estudo-da-genetica/. Acesso em: 01 out. 2023.
[7] Kague, E. Estudo da regulação transcricional do COLI8A1 e análise funcional do domínio Frizzled. Disponível através do link: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/41/41131/tde-28102009-144108/pt-br.php. Acesso em: 01 out. 2023.
[8] Boleli, I. et al. ABECEDÁRIO GENÉTICO. Disponível através do link: https://www.unesp.br/prograd/PDFNE2004/artigos/eixo10/abecedario.pdf. Acesso em: 01 out. 2023.
[9] Passos-Bueno, MR. et al. Knobloch syndrome in a large Brazilian consanguineous family: Confirmation of autosomal recessive inheritance. Am J Med Genet. 1994; 52(2):170-173.
[10] National Center for Biotechnology Information (NCBI). COL18A1: colágeno tipo XVIII cadeia alfa 1, 2023. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/gene/80781 . Acesso em: 01 out. 2023.
[11] Finegol, D. Genes e Cromossomos. Disponível através do link: https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/fundamentos/gen%C3 %A9tica/genes-e-cromossomos. Acesso em: 01 out. 2023.
[12] Marcuzzo, S. Aula_neuro_embriologia. Disponível através do link: https://professor.ufrgs.br/simonemarcuzzo/files/aula_neuro_ embriologia.pdf. Acesso em: 01 out. 2023.