
Entrevista:
Fernanda de Oliveira Bustamante

FERNANDA DE OLIVEIRA BUSTAMANTE
Bióloga (bacharel e licenciada) pela UFLA, com mestrado, doutorado e pós-doutorado em Genética e Melhoramento de Plantas pela mesma instituição e pelo IPK/Alemanha. Professora de Genética na UEMG – Divinópolis, líder do LAGEN e de grupos de pesquisa em citogenética e citogenotoxicidade. Atua em análises genéticas humanas e ambientais, como no monitoramento da água após o rompimento da barragem de Brumadinho. É coordenadora do NIT/UEMG e integra comissões de inovação, empreendedorismo e bem-estar animal.
Anne Aparecida Coelho da Costa¹, Bárbara Laís Nascimento Silva¹, Bruna Peres Carvallho¹, Driely Rodrigues¹, Gabriel Teodoro Sirimarco², Lívia Corrêa Ferreira¹ e Letícia Gabriela Rocha Cunha³
¹Graduandas do curso de Bioquímica (UFSJ CCO)
²Graduando do curso de Medicina (UFSJ/CCO)
³Graduanda do curso de Farmácia (UFSJ/CCO)
v.3, n.7, 2025
Julho de 2025
Quando percebeu que possuía interesse por ciência?
Paralelamente ao meu interesse em me tornar professora, já veio o interesse pela ciência. Desde quando eu pensava em ser professora eu já era muito questionadora. Eu gostava muito de experimentar as coisas. Desde criança, eu me lembro de fazer experiências simples. Sempre fui uma pessoa muito curiosa. Então, quando eu entrei na faculdade, eu comecei, já no primeiro período, a fazer iniciação científica em genética e amei, e nunca mais parei. Eu nunca fiquei sem bolsa, sempre pesquisando. Então, foi algo muito natural.
Teve dúvidas ao realizar a escolha do curso de graduação?
Não. Eu fui influenciada por dois professores de biologia do meu ensino médio, ambos foram fantásticos. Eu me espelhava muito neles. Olhava como eles ministravam as aulas e pensava: nossa! Quero ser assim um dia. Então, eu tinha muito claro o que queria fazer, quando eu tentava o vestibular, era sempre biologia. Não cogitei outro curso.
O que considera ter sido decisivo em sua escolha por seguir a carreira científica?
Eu percebi que eu gostava muito da pesquisa. Sempre achei muito gratificante poder contribuir com o avanço da ciência. No começo da minha graduação e mestrado, trabalhei muito com ciência básica, com citogenética, avaliando marcas específicas nos cromossomos. Então, eu acho isso muito fantástico, porque se a gente pensar a ciência como um todo, nada mais é que um quebra-cabeça, constituído por várias pesquisas diferentes que vão se encaixando, resultando em algo concreto. Então, eu queria muito fazer parte dessas pecinhas do quebra-cabeça, e isso me motivou sempre a querer algo mais. Eu gosto de desafio, acho que foi isso que me impulsionou a seguir diferentes rumos.
Por qual razão optou por dedicar-se à área de estudos na qual realiza suas pesquisas?
Foi muito em virtude do que tinha disponível no momento. Então, como eu fiz a minha graduação, mestrado, doutorado na UFLA, o forte lá é genética vegetal. Quando eu entrei, eu queria muito trabalhar com genética humana, mas não era possível. Foi ótimo! Me apaixonei por vegetal. Na verdade, a maior parte da minha vida acadêmica foi em vegetal, agora que eu estou mudando para humano. Até a linha de citogenotoxicidade eu fui desenvolver com autonomia, aqui no laboratório, bem recentemente. Eu fiz o que era possível no momento, mas eu amei tudo o que fiz.
Qual a principal motivação para seguir trabalhando com ciência no Brasil?
Porque eu sinto que aqui eu sou necessária. Estar aqui no Brasil, em Divinópolis, na UEMG, é uma opção. Porque eu sinto que eu tenho que retribuir, para a sociedade, tudo investido em mim. Desde o primeiro período, sempre tive bolsa. Então, me sinto na obrigação de reverter isso para a sociedade, coloco o meu trabalho como uma doação. Seja por uma análise de água de um rio, seja para ver se a população de uma determinada região tem alguma alteração cromossômica, seja por estudos em plantas. Há 5 anos que estou aqui; já tive a oportunidade de sair, mas eu amo. Eu abracei Divinópolis como se fosse a minha cidade. Eu me sinto muito necessária na UEMG. Então, eu até brinco que é luta atrás de guerra. A gente ganha hoje uma batalha, mas no outro dia tem que continuar. Aqui eu sou muito necessária porque aqui tem muitas lutas que eu tenho que lutar. Em outros locais, essas lutas já foram conquistadas.
Qual a principal dificuldade que enfrenta trabalhando com ciência no Brasil?
São tantas dificuldades... Eu não sei dizer uma em específico, mas quando eu cheguei aqui, não tinha recurso. Não tinha estrutura, não tinha nada. Quando cheguei, perguntei onde eram os laboratórios de pesquisa, então falaram: “aqui não tem isso”, e depois: “tem uma sala em um bloco ali que tem alguns microscópios, mas eles nem funcionam direito”. Foi um impacto muito grande. Eu submeti projetos para conseguir o recurso financeiro. Recebi seis “nãos” até conseguir na sétima. É desestimulante esse não. Então, eu colocaria como maior dificultador a falta de recurso. É muito difícil você iniciar o processo e uma vez que você consegue, é difícil você manter também. Tem que ter persistência.
O que gostaria de dizer para quem deseja seguir a carreira científica?
Não é uma jornada fácil. Vão ter pedras no caminho, mas é extremamente gratificante. É lindo ver o crescimento, o amadurecimento profissional desses estudantes, ver cada pessoa contribuindo um pouquinho, colocando um tijolinho para a ciência progredir. No final, tudo vale a pena quando a gente vê esses alunos conquistando o mercado de trabalho, a independência e também tendo esse amor para seguir e continuar esse trabalho. É um trabalho de formiguinha. É você ir mostrando que, mesmo com as dificuldades, se é o que a pessoa quer fazer, vale a pena. É graças a essa diversidade que a gente consegue avançar, mas o fato da pessoa ter feito um curso superior, eu acredito que propicia que ela abra a mente para muitas coisas. Sem alunos, não há universidade. Por isso, a nossa primeira obrigação é dar aula. Sem alunos, não têm instituição. Aí não tem pesquisa, não tem nada.
O que faria de diferente hoje se fosse seguir novamente a carreira científica?
Se eu fosse dar um conselho para a Fernanda que estava lá na graduação, eu falaria para ela ficar muito tranquila. Porque era uma Fernanda muito ansiosa com relação ao que iria acontecer. Às vezes, a gente traça um objetivo e persegue muito ele, mas parece que as coisas se resolvem de uma forma muito natural. E, foi isso que aconteceu comigo. Então, se eu pudesse dar um conselho, seria: se cobre menos, não fique ansiosa e aproveite mais o agora. Porque, de alguma forma, o universo conspira para que as coisas aconteçam, se cerque de pessoas que te apoiam, que pensam da mesma forma que você. No final, todo mundo se ajudando, não tem como dar errado, vai dar certo.