
Tentativas recentes de desenvolvimento de fármacos contra o Alzheimer
Anna Luiza Ferreira Vieira¹, Jhennifer Lorrane da Silva Pereira Dias¹, Maria Eduarda Botelho¹, Maria Fernanda Araújo Porto¹, Nycolas Emanuel Santiago Carneiro¹, Thamyris Neves do Nascimento¹
¹Graduandos do curso de Bioquímica (UFSJ-CCO)
v.3, n.11, 2025
Novembro de 2025
A Doença de Alzheimer (DA) envolve a perda progressiva das funções cerebrais de forma progressiva e irreversível, que resulta na perda total das funções cognitivas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 50 milhões de pessoas em todo o globo são afetadas [1]. Estima-se que para 2030 sejam 78 milhões e para 2050 o número de pacientes atinja 139 milhões de pessoas. No Brasil, cerca de 1,5 milhões de pessoas são acometidas por DA e em 30 anos a situação pode quadruplicar numericamente [2]. Sendo assim, o desenvolvimento de fármacos para tratamento de DA representa uma situação de extrema urgência para a população mundial.

Figura 1: Progressão da DA - comparação entre um cérebro saudável, um cérebro de paciente com DA em estágio inicial (TNC leve), e um com DA avançada (TNC grave).
Fonte: Adaptado de Informasus/UFSCar (2021).
Atualmente, apenas um fármaco contra DA encontra-se aprovado pela agência regulatória de medicamentos do Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Este é o Donanemabe (Kisunla) aprovado em abril de 2025. Desenvolvido pela empresa Eli Lily, consiste em uma proteína de defesa (anticorpo) que se liga a estruturas existentes no cérebro de pacientes com DA (placas beta amiloides) e que causam danos aos pacientes.
Estas placas são prejudiciais ao cérebro humano pois, se livres (não ligadas ao anticorpo medicamento), matam células importantes: os neurônios. Estas placas são consideradas os principais marcadores específicos precoces dessa doença, ou seja, quando presentes no cérebro de um paciente permitem o diagnóstico da DA antes mesmo dos sintomas aparecerem. O prejuízo que estas estruturas causam pode chegar a ser, por exemplo, reduzido em até 35% pelo uso do medicamento nas primeiras fases da doença. O Kisunla deve ser administrado diretamente nas veias do paciente todo mês. No entanto, apesar da aprovação, o medicamento ainda não está sendo amplamente comercializado e aguarda acordo para disponibilidade no SUS [3].
Existe ainda no mundo um segundo medicamento. Este já foi aprovado para uso nos Estados Unidos, mas ainda não foi solicitado pelo fabricante a autorização à ANVISA. É chamado Lecanemabe (Leqembi) e foi no ano passado pela agência americana. Desenvolvido pelos laboratórios Eisai e Biogen, age da mesma forma. Consiste em anticorpo contra placas amiloides; no entanto, age na fase intermediária de sua formação, reduzido o número de placas formadas. Retarda, assim, a progressão da doença em 27% nas manifestações iniciais. Da mesma maneira que Donanemabe, essa mediação é aplicada nas veias do paciente e ainda não está disponível no mercado nacional [4].
Paralelamente, tem-se outras abordagens muito importantes para a construção de novos fármacos. Dentre elas, destaca-se aquelas focadas na proteína Tau. Esta proteína existe nos neurônios associadas ao arcabouço proteico que sustenta e da forma à célula: o citoesqueleto; mais especificamente, está associadas a filamentos chamados microtúbulos dentro dos neurônios. Em pacientes DA, alterações na proteína Tau resultam em modificações estruturais causando a formação de emaranhados chamados neurofibrilares: agregados anormais dentro dos neurônios. Tal evento favorece a morte das células neuronais, causando, assim como as placas amiloides, neurodegeneração nos pacientes. Alguns exemplos desses fármacos que agem diretamente nessa proteína são o Zagotenemabe (anticorpo que se liga à proteína Tau diminuindo sua agregação) e o Semorinemabe (que inibe as modificações da estrutura da Tau, diminuindo a formação de aglomerados) [5].
Além destas abordagens mais clássicas para tratamento da DA, há ainda estudos envolvendo outras estratégias, como a modulação do sistema de defesa (sistema imune) baseadas na diminuição da inflamação cerebral no paciente com DA. No sistema nervoso central (cérebro e medula), existe um tipo celular que funciona como as principais células do sistema imunológico, as microglias. No entanto, quando muito ativadas, se tornam um problema pelo excesso de inflamação gerado como consequência. Nesse cenário, o anticorpo AL002 (medicamento experimental) se mostrou capaz de diminuir a inflamação [6, 7]. Nesta mesma linha, o Pepinemab age também impedindo a super ativação da microglia, ou seja, do sistema imune neuronal, para preservação da funcionalidade do cérebro [8].
Há também estudos que envolvem compostos naturais e suas propriedades anti-inflamatórias e neuroprotetoras. Compostos como alcaloides, chalconas, flavonoides e cumarinas, presentes em plantas, são amplamente estudados principalmente pela habilidade de inibição de proteínas que aceleram velocidades de reações (enzimas) importantes no processo de desenvolvimento da DA [9].
É importante ressaltar que, atualmente, uma infinidade de fármacos para Alzheimer estão sendo desenvolvidos, visando várias abordagens diferentes e até mesmo abordagens conjuntas para melhor tratamento da DA. No entanto, todos apresentam efeitos colaterais relevantes, até mesmo o já aprovado citados anteriormente. Vários medicamentos anteriores como Aducanumabe (Aduhelm) [10] e Solanezumabe [11] foram retirados do mercado justamente por seus efeitos indesejados serem mais prejudiciais que suas possíveis contribuições neuroprotetoras. Outros como o Gantenerumabe não ofereceram o resultado esperado [12].
Portanto, a produção de novos medicamentos envolve uma complexidade de estudos que duram anos, e requer ainda mais atenção quando se lida com doenças tão difíceis e desafiadoras de tratar-se como a DA. No Brasil, estes novos medicamentos também enfrentam desafios estruturais e socioeconômicos. Isto porque: 1) a grande maioria dos pacientes recebe seu diagnóstico em fases mais avançadas da doença: momento no qual o medicamento disponível não age de maneira otimizada (ele atua em estágio inicial); 2) a infraestrutura hospitalar disponível para grande parte da população não é adequada para acompanhamento tanto da progressão da doença como do tratamento; 3) o custo final do medicamento é geralmente muito elevado, pela alta tecnologia aplicada em seu desenvolvimento (o que impede de atender-se a toda a população que necessita através do Sistema Único de Saúde (SUS)).
Portanto, no cenário atual, as tentativas de desenvolvimento de fármacos para o Alzheimer resultaram até o momento em uma opção com resultados aceitáveis e autorizada para comercialização no Brasil. Porém, para uso em estágios iniciais da DA. No entanto, existem vários estudos em andamento visando oferecer novas possibilidades. As diversidades de opções terapêuticas e suas possíveis associações entre elas no futuro representam uma nova esperança para os pacientes. Espera-se que cada vez mais, com o avanço dos estudos, a construção de um tratamento amplamente eficaz para DA se torne realidade nos próximos anos.
Referências Bibliográficas
[1] World Health Organization (WHO). 2025. Dementia. Disponível através do link: https://www.who.int/health-topics/dementia#tab=tab_2. Acesso em Acesso em: 05 nov. 2025.
[2] Portal Hospitais Brasil. Casos de Alzheimer no Brasil podem quadruplicar sem Plano Nacional de Cuidado às Demências. Disponível através do link: https://portalhospitaisbrasil.com.br/casos-de-alzheimer-no-brasil-podem-quadruplicar-sem-plano-nacional-de-cuidado-as-demencias/. Acesso em: 05 nov. 2025.
[3] Febraz. Donanemabe é aprovado no Brasil: Febraz celebra avanço e reforça seu posicionamento técnico. Disponível através do link: https://febraz.org.br/donanemabe-e-aprovado-no-brasil-febraz-celebra-avanco-e-reforca-seu-posicionamento-tecnico/. Acesso em: 05 nov. 2025.
[4] Junior L. Resumo sobre Lecamenabe: definição, uso e mais! Disponível através do link: https://med.estrategia.com/portal/conteudos-gratis/farmacos/resumo-sobre-lecamenabe-definicao-uso-e-mais/. Acesso em: 05 nov. 2025.
[5] Pinheiro LN. et al. Imunoterapia no tratamento das doenças neurodegenerativas. Brazilian Journal of Health Review, Curitiba, v. 7, n. 3, p. 1-23, 2024.
[6] Johnson V. First Patient Dosed With AL002 in Phase 2 Early Alzheimer Disease Study. Disponível através do link: https://www.neurologylive.com/view/first-dosage-al002-phase-2-early-alzheimer-disease. Acesso em: 05 nov. 2025.
[7] Vilar D. As novas drogas para o tratamento da Doença de Alzheimer CID11 6D80. Disponível através do link: https://deboravilarneuro.com.br/as-novas-drogas-para-o-tratamento-da-doenca-de-alzheimer-cid11-6d80/. Acesso em: 05 nov. 2025.
[8] ALZFORUM. Pepinemab. 2025. Disponível através do link: https://www.alzforum.org/therapeutics/pepinemab. Acesso em: 05 nov. 2025.
[9] Vellosa A. et al. Atividade anti – Alzhermer de substâncias oriundas de produtos naturais e de origem sintética: Alguns exemplos importantes dos últimos 20 anos. Química Nova, 2022.
[10] Globaldata Healthcare. Biogen discontinues Aduhelm to focus on Leqembi for Alzheimer’s disease. Disponível através do link: https://www.pharmaceutical-technology.com/analyst-comment/biogen-discontinues-aduhelm-alzheimers. Acesso em: 05 nov. 2025.
[11] Park AA. Promising Alzheimer’s Drug Doesn’t Work After All. Disponível através do link: https://time.com/4581267/eli-lilly-company-alzheimers-disease-drug. Acesso em: 05 nov. 2025.
[12] Alzheimer Europe. Roche discontinues clinical trials of gantenerumab, after GRADUATE studies fail to meet their primary endpoints. 2022. Disponível através do link: https://www.alzheimer-europe.org/news/roche-discontinues-clinical-trials-gantenerumab-after-graduate-studies-fail-meet-their-primary?language_content_entity=en. Acesso em: 05 nov. 2025.