O Legado de Adolfo Lutz na Luta Contra a Febre Amarela: Uma História de Resiliência e Descobertas
Mariana de Fátima Rabelo Silva, Joseane Oliveira Pereira, Leonardo Maciel Santos Silva, Bruna Aparecida Vieira Mathias, Maria Eduarda de Oliveira Lima
Graduandos do curso de Bioquímica (UFSJ-CCO)
v.2, n.6, 2024
Junho de 2024
Nascido em 1855, Adolfo Lutz foi um renomado médico e pesquisador brasileiro, reconhecido por seu trabalho pioneiro em medicina tropical (área da medicina que se dedica ao estudo, prevenção, diagnóstico e tratamento das doenças infecciosas e parasitárias predominantes em regiões tropicais, onde condições socioeconômicas e ambientais facilitam sua propagação). Formou-se na Universidade de Berna em 1879, realizou diversas especializações na Europa e alguns anos depois retornou ao Brasil [1]. Foi diretor do Instituto Bacteriológico de São Paulo e posteriormente se transferiu para a Fundação Oswaldo Cruz [2].
Entre o final do século 19 e início do século 20 Adolfo Lutz juntamente com seus auxiliares, efetuaram pesquisas de grande importância referente às doenças infecciosas, que vinham se proliferando por São Paulo, dentre estas enfermidades destaca-se a febre amarela. Em agosto de 1897, um parecer crítico foi emitido por Adolpho Lutz e colaboradores, sobre uma pesquisa realizada em laboratório, discordando dos resultados de um estudo clínico conduzido por médicos no Rio de Janeiro. O parecer questionou diversos aspectos do método e dos resultados, incluindo a eficácia do tratamento, a possível contaminação dos materiais utilizados e a falta de identificação precisa do micróbio associado à febre amarela [2-3].
Adolfo Lutz realizou pesquisas, juntamente com outros bacteriologistas, que estavam convictos que seria uma bactéria a causadora da doença. Identificaram a presença do bacilo icteróide (que seria então o agente causador da febre amarela) no sangue dos infectados com febre amarela. Esta descoberta foi analisada de forma ponderada. Lutz inicialmente considerou que o bacilo icteróide poderia ser uma variante do colobacilo (bacilo presente no intestino dos homens e animais, que costumava ser muito virulento para os animais quando isolado em casos de febre amarela). Embora pouco característico, sua ação patogênica foi reconhecida após uma extensa pesquisa. Lutz observou que o bacilo era encontrado principalmente no sangue e nas vísceras em quantidades reduzidas, sua presença só se tornava mais frequente no final da doença. Isolar o bacilo era desafiador, o que explica sua baixa taxa de sucesso em comparação com outras doenças microbianas. No entanto, em meio aos estudos, foi esclarecido o modo pelo qual a malária era transmitida: picada pela fêmea do mosquito-prego, identificado pelos cientistas como pertencente ao gênero Anopheles. Tal fato reorientou as análises de como seria a transmissão da febre amarela [3].
Sabe-se hoje, graças às pesquisas de Lutz, que o agente causador desta doença é um vírus, e essa doença viral é também transmitida por mosquitos - pertencentes aos gêneros Haemagogus, Sabethes e Aedes (Figura 1) – contaminados com o vírus [4]. O nome “febre amarela” deve-se ao sintoma conhecido como icterícia, no qual os pacientes apresentam os olhos e pele amarelados. Esta manifestação geralmente está associada a danos no fígado [5]. Dentre outros indícios que o paciente pode apresentar, destaca-se febre súbita, dores no corpo e nas costas, dor de cabeça, náuseas e fadiga muscular. Cerca de 15% dos infectados podem apresentar um período sem sintomas, seguido de desenvolvimento de formas graves da doença que podem causar a morte. Nesse caso, é possível observar a ocorrência de, além da previamente mencionada icterícia, dores abdominais, vômitos e sangramentos [6].
Figura 1: Ilustração de uma picada de mosquito que simboliza, de forma simples, como pode ocorrer a transmissão da febre amarela.
Não existe, até o momento, um medicamento específico para a febre amarela, havendo apenas remédios que reduzem os sintomas. Sendo assim, após a ocorrência da doença, deve-se buscar ajuda médica para que estes profissionais possam minimizar os efeitos dos sintomas bem como acompanhar o quadro clínico dos pacientes [4]. Portanto, a melhor forma de minimizar os efeitos da doença se dá por meio da vacinação. A vacina é de fácil acesso devido ao programa do Sistema Único de Saúde (SUS) que a garante no esquema vacinal dos brasileiros. A vacinação se inicia na infância, sendo necessárias duas doses para garantir proteção[5-6].
Além disso, um controle sobre o vetor (organismo capaz de transmitir doenças infecciosas entre hospedeiros) pode ser feito tanto pelo Estado, com campanhas de redução de focos do mosquito, quanto pela população, com medidas de proteção individual (repelentes por exemplo) e eliminação de possíveis criadouros do mosquito [4]. Essas atitudes ainda auxiliam no controle da disseminação de outras doenças que têm esses insetos como vetores.
As contribuições de Adolfo Lutz para o estudo da febre amarela foram profundamente impactantes e representaram um marco crucial no entendimento e controle dessa doença. Sua dedicação incansável à pesquisa epidemiológica (estudo da propagação das doenças) e laboratorial estabeleceu as bases para o diagnóstico preciso e controle desse patógeno, e continuam a ser relevantes para a saúde pública até os dias de hoje. Seu legado é um testemunho do poder da ciência e da dedicação de indivíduos como Lutz, em melhorar a saúde e o bem-estar das populações afetadas por doenças infecciosas.
Referências Bibliográficas
[1] Frazão, D. Biografia de Adolfo Lutz. Disponível através do link: https://www.ebiografia.com/adolfo_lutz/. Acesso em: 05 jun 2024.
[2] Ferreira, L. et al. Adolpho Lutz enfrentou epidemias de forma incansável. Disponível através do link: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-12/adolpho-lutz-enfrentou-epidemias-de-forma-incansavel. Acesso em: 05 jun 2024.
[3] Benchimol, JL. Adolpho Lutz: um esboço biográfico. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 10, p. 13-83, 2003.
[4] Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Febre Amarela. Disponível através do link: https://www.paho.org/pt/topicos/febre-amarela. Acesso em: 05 jun 2024.
[5] Hospital Israelita Albert Einstein. Guia de Doenças e Sintomas. Disponível através do link: https://www.einstein.br/doencas-sintomas/ictericia. Acesso em 05 jun 2024.
[6] BRASIL. Ministério da Saúde. Biblioteca Virtual em Saúde. A febre amarela entra no debate. Disponível através do link: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/julho/ministerio-da-saude-reforca-importancia-da-vacinacao-contra-a-febre-amarela. Acesso em 05 jun 2024.