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A omissão nos check-ups e o Alzheimer

Luiza Maria Policarpo Tonelli

Curadora e cuidadora de paciente com Alzheimer durante 16 anos

v.3, n.4, 2025

Abril de 2025

A agência norte-americana dedicada à pesquisa e à qualidade em saúde (Agency for Healthcare Research and Quality) recomenda que a partir de 35 anos as pessoas, anualmente, realizem visita anual ao médico para realização de check-up (que envolve exames em indivíduos sem sintomas de doenças). Após 50 anos, além de exames de sangue (envolvendo, por exemplo, dosagem de glicose e colesterol) são também comumente solicitados colonoscopia (a cada 10 anos) e ultrassom [1]. Há médicos que também solicitam, especialmente se há risco de hipertensão arterial sistêmica (conhecida popularmente como pressão alta), análises para sondar o funcionamento do coração (eletrocardiograma e/ou ecocardiograma), e às vezes até o Monitoramento Ambulatorial da Pressão Arterial (MAPA) [2]. Para as mulheres de 50 a 69 anos, exames de rotina geralmente incluem mamografia a cada dois anos [3], e para homens, o exame preventivo de câncer de próstata é recomendado de ser realizado a partir de 50 anos se não houver casos da doença na família [4].

 

O que é curioso, é que não é feita nenhuma sondagem do cérebro destas pessoas. Não é aplicado nenhum teste de memória e nem pedida uma tomografia. Esta última possui alguns riscos para realização, como possíveis alergias ao contraste [5], porém os testes de memória poderiam ser facilmente realizados. Uma justificativa que pode estar associada ao não os realizar é a de que uma vez instalada uma demência (doença que afeta progressivamente capacidade de realizar atividades, pensamento e memória do paciente), como a Doença de Alzheimer (DA) ou Mal de Alzheimer, nada pode ser feito para cura: pois não se recupera a memória ou capacidade perdida [6].

A Doença de Alzheimer foi identificada pela primeira vez em 1906 pelo psiquiatra e neurologista alemão Alois Alzheimer. Este acompanhou uma paciente chamada Auguste Deter, que apresentava mudanças de personalidade, desorientação e perda de memória. Após o falecimento da mesma, durante uma autópsia, o médico em questão descobriu no cérebro dela alterações anormais: a presença das chamadas placas senis (agregados indesejados de proteínas que atrapalham a comunicação das células chamadas neurônios) (Figura 1) e de emaranhados neurofibrilares (emaranhados anormais encontrados dentro de neurônios de pacientes com DA) [7].

 

Cinco anos mais tarde Alzheimer publicou os resultados de seus estudos relacionando estes achados da autópsia com os sintomas da paciente, e a DA foi nomeada em sua homenagem, posteriormente [7,8]. Os achados relatados por Alzheimer causam a morte de neurônios [9] e a nossa capacidade de regeneração de neurônios perdidos é pequena no cérebro. Logo, esta morte destas células é sentida, prejudicando o funcionamento cerebral [10]. A DA, até o presente momento, não tem cura.

 

No entanto, existem algumas mudanças nos hábitos de vida que podem contribuir para desacelerar o avanço da doença, incentivando a chamada neuroplasticidade (capacidade de adaptação e reorganização) dos neurônios restantes. Se a pessoa é orientada a praticar atividades físicas (um simples caminhar por cerca de meia hora, todos os dias, é um conhecido neuroprotetor) [11, 12], intelectuais e sociais; a estudar, ler ou executar jogos inteligentes ou exercícios de aritmética, mantendo a mente ativa, ela pode retardar que os sintomas da DA sejam sentidos [13], especialmente se ainda em estágio inicial.

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Figura 1: Imagem ao microscópio de corte de cérebro de paciente com DA, destacando-se placas senis com quadrados vermelhos.

Fonte:  https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Alzheimer_dementia_%283%29_presenile_onset.jpg

A população está envelhecendo, o número de idosos aumentando e com ele está ocorrendo o crescimento do número de casos de DA diagnosticados. Com sede no Reino Unido, a Alzheimer's Disease International estima que, no mundo, haverão em 2030 74,7 milhões de pessoas com DA e em 2050, 131,5 milhões [14]. A doença costuma evoluir por quatro estágios, segundo o Ministério da Saúde do Brasil, de forma lenta e progressiva [13]. Curar não se pode, mas permitir aos pacientes uma sobrevida maior e com mais qualidade, é possível.

 

Um relatório divulgado por este Ministério em 2024, revelou que 2,71 milhões de pessoas com 60 anos ou mais sofrem com DA no Brasil, o que corresponde a cerca de 8,5% da população idosa [15].

 

Diante deste cenário é fácil constatar que tanto no Brasil como no mundo, a doença tem apresentado um número de diagnósticos bastante significativo. Logo, realizar um check-up, e se comprovado que o corpo está bem concluir que o cérebro também está, não corresponde necessariamente à verdade. Pode-se estar deixando de diagnosticar uma demência, fugindo-se de uma realidade caótica e que já se tornou mundial no caso da DA, como demonstrado no presente texto.

 

A doença já se instalou entre nós e se não há cura é preciso pelo menos tentar retardá-la visando trabalhar ao máximo o paciente com exercícios físicos, sociais e mentais para que a neuroplasticidade seja incentivada e desacelerem-se os prejuízos ao mesmo. Os testes de memória ou algum outro tipo de diagnóstico para DA e demais demências deveriam estar presentes no check-up, especialmente de pacientes idosos. A família e o paciente têm o direito de saber sobre a saúde mental do mesmo, para que em caso de diagnóstico de DA, o mais cedo possível comecem a jornada contra este mal implacável.

Referências Bibliográficas

[1] Simões FA. Check-up. Disponível através do link: https://www.saudedireta.com.br/docsupload/1335442683Fasc4_checkup_parte_001.pdf. Acesso em:  10 abr. 2025.

[2] Racanelli P, Campos PRLdeA Principais Doenças Crônicas Não Transmissíveis De Uma Amostra Em Um Plano De Saúde Da Grande Vitória. Disponível através do link: https://unisales.br/wp-content/uploads/2023/06/PRINCIPAIS-DOENCAS-CRONICAS-NAO-TRANSMISSIVEIS-DE-UMA-AMOSTRA-EM-UM-PLANO-DE-SAUDE-DA-GRANDE-VITORIA.pdf. Acesso em: 10 abr. 2025.

[3] INCA. Mamografias no SUS. Disponível através do link: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/gestor-e-profissional-de-saude/controle-do-cancer-de-mama/dados-e-numeros/mamografias-no-sus#:~:text=Segundo%20as%20Diretrizes%20para%20a,vez%20a%20cada%20dois%20anos. Acesso em: 10 abr. 2025.

[4] Agência Senado. Novembro Azul recomenda exames da próstata para prevenção de câncer. Disponível através do link: https://www12.senado.leg.br/noticias/infomaterias/2022/11/novembro-azul-recomenda-exames-da-prostata-para-prevencao-de-cancer#:~:text=—%20Se%20há%20na%20sua%20família,pode%20começar%20aos%2050%20anos . Acesso em: 10 abr. 2025.

[5] Centro Radiológica. Quem não pode fazer Tomografia? Entenda as contraindicações. Disponível através do link: https://centroradiologico.med.br/quem-nao-pode-fazer-tomografia-entenda-as-contraindicacoes/#:~:text=Quais%20são%20os%20riscos%20que,pacientes%20com%20insuficiência%20renal%20preexistente . Acesso em: 10 abr. 2025.

[6] Maranhão F. Como cuidar de uma pessoa com demência? Disponível através do link: https://drauziovarella.uol.com.br/neurologia/como-cuidar-de-uma-pessoa-com-demencia/#:~:text=Maioria%20das%20demências%20não%20tem,normal%20e%20encefalites”%2C%20cita . Acesso em: 10 abr. 2025.

[7] BBC News Brasil. Quem foi Alois Alzheimer, o neuropsiquiatra que descobriu a demência que afeta milhões de pessoas. Disponível através do link: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cn0j2mlvv0yo#:~:text=Podcasts-,Quem%20foi%20Alois%20Alzheimer%2C%20o%20neuropsiquiatra%20que%20descobriu%20a,que%20afeta%20milhões%20de%20pessoas&text=Em%201901%2C%20a%20vida%20do,de%20“doença%20do%20esquecimento” . Acesso em: 10 abr. 2025.

[8] Möller HJ, Graeber, MB. The case described by Alois Alzheimer in 1911. Historical and conceptual perspectives based on the clinical record and neurohistological sections. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci. v. 248, n. 3, p. 111-122, 1998.

[9] Biblioteca Virtual em Saúde. Doença de Alzheimer. Disponível através do link: https://bvsms.saude.gov.br/doenca-de-alzheimer-3/#:~:text=Como%20conseqüência%20dessa%20toxicidade%2C%20ocorre,estímulos%20sensoriais%20e%20pensamento%20abstrato . Acesso em: 10 abr. 2025.

[10] Superinteressante. Os neurônios se regeneram? Disponível através do link: https://super.abril.com.br/ciencia/cada-neuronio-sabe-muito-bem-sua-funcao/ . Acesso em: 10 abr. 2025.

[11] Borges C. Atividade física pode ajudar na prevenção do Alzheimer: confira como. Disponível através do link: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/atividade-fisica-pode-ajudar-na-prevencao-do-alzheimer-confira-como/#:~:text=Tanto%20exercícios%20aeróbicos%2C%20como%20corrida,também%20trazem%20benefícios%20(41%25) . Acesso em: 10 abr. 2025.

[12] De Castro D. Atividade Física e Cérebro - Saiba Mais! Disponível através do link: https://drdiegodecastro.com/atividade-fisica-e-cerebro/#:~:text=Fortalece%20o%20Cérebro?-,O%20que%20é%20Neuroplasticidade?,fatores%20neurológicos%2C%20como%20descrevemos%20abaixo . Acesso em: 10 abr. 2025.

[13] BRASIL. Doença de Alzheimer. Disponível através do link: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/a/alzheimer . Acesso em: 10 abr. 2025.

[14] Agência Brasil. Dia Mundial do Alzheimer alerta para aumento de casos no mundo. Disponível através do link: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2022-09/dia-mundial-do-alzheimer-alerta-para-aumento-de-casos-no-mundo#:~:text=A%20OMS%20alerta%20para%20a,%2C5%20milhões%2C%20em%202050 . Acesso em: 10 abr. 2025.

[15] Brasil. Relatório Nacional sobre a Demência estima que cerca de 8,5% da população idosa convive com a doença. Disponível através do link: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/relatorio-nacional-sobre-a-demencia-estima-que-cerca-de-8-5-da-populacao-idosa-convive-com-a-doenca#:~:text=De%20acordo%20com%20o%20estudo,pessoas%20sejam%20diagnosticadas%20no%20país . Acesso em: 10 abr. 2025.

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