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Doença de Chagas: histórico, informações e novas possibilidades

Ana Clara da Cunha, Anderson Fernandes de Oliveira Filho, Arthur Lage Leão, Débora Célia Viana Silva, Guilherme Augusto da Silva Barbosa, Helena Catizani Franco de Faria, Julia Martins Santos Sousa, Rafael Lacerda Leao de Oliveira, Stella Honório Prado, Yana Sofia de Jesus Oliveira

Graduandos do curso de Medicina (UFSJ-CCO)

v.2, n.1, 2024
Janeiro de 2024

A doença de Chagas foi descoberta em 1909 pelo médico e cientista brasileiro Carlos Chagas, que trabalhou para a erradicação da malária no estado de São Paulo e, posteriormente, se mudou para o norte de Minas Gerais, onde passou a exercer a medicina em prol da melhoria da saúde de pessoas afetadas por doenças tropicais. Nesse contexto, Chagas teve contato com os barbeiros (Figura 1) [1] - que coabitavam casas da população, detectou protozoários no intestino desses animais e, juntamente, observou sintomas diversos que afligiam as pessoas. Em agosto de 1909, publicou o artigo em que definiu a doença responsável pelos sintomas manifestados pela população como “Tripanossomíase americana”, hoje conhecida como Doença de Chagas. 

 

Carlos Chagas representa uma personalidade histórica para a Medicina, pois descreveu todos os aspectos de uma mesma doença, como o agente causador, o vetor capaz de levar o causador até os seres humanos, os reservatórios na natureza (estoques do agente causador), além de inferir seu impacto biopsicossocial [2]. 

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Figura 1: Barbeiro vetor do Trypanosoma cruzi (parasito causador da Doença de Chagas)

Fonte: https://www.flickr.com/photos/agenciabrasilia/39327044725

A enfermidade tem como agente causador o protozoário Trypanosoma cruzi e como vetor barbeiros que se alimentam de sangue, como os da espécie Triatoma infestans.  É  uma condição que  pode ser transmitida  de diferentes maneiras, como pelo contato com fezes e/ou urina de barbeiros após a picada, via materno-fetal (de mãe para o feto), transfusão de sangue, transplante de órgãos e ingestão de alimentos contaminados com parasitos provenientes de barbeiros infectados [3]. 

Desde sua descoberta, a doença de Chagas representa um importante problema de saúde pública, tendo em vista que possui um grande impacto socioeconômico, principalmente na América Latina, onde estão a maioria dos casos. No Brasil, a situação tem mudado ao longo do tempo, em virtude de ações sanitárias de controle e de transformações socioambientais e econômicas. Estima-se, atualmente, a existência de 1,9 a 4,6 milhões de pessoas infectadas (1 a 2,4% da população), além de ser uma das quatro maiores enfermidades infecciosas e parasitárias causadoras de morte no país. Logo, a detecção e manejo são desafios atuais no Brasil e que requerem atenção dos gestores de saúde [3, 4]. 

 

As manifestações dos sintomas da infecção pelo T. cruzi podem ser divididas em 3 estágios principais, seguindo a seguinte evolução: 

Forma aguda: que pode ser sintomática ou assintomática e é caracterizada pela possível aparição dos chagomas (lesão de pele endurecida e avermelhada que aparece no local da picada) e o Sinal de Romaña, que é caracterizado pela inflamação e inchaço dos olhos;

Forma crônica indeterminada: que não apresenta a manifestação de sintomas, mas possui evidências em testes de infecção por T. cruzi.

Forma crônica: que tem como característica o envolvimento cardíaco ou do trato gastrointestinal [5].

Além disso, a Doença de Chagas tem um impacto significativo na saúde, no bem-estar psicológico e na vida social daqueles que a contraem. Ela representa uma carga financeira considerável para os sistemas de saúde, devido à alta demanda por consultas médicas, exames, tratamentos médicos, intervenções cirúrgicas e medicamentosas. Ademais, essa doença causa sérias consequências econômicas, incluindo a perda de mão de obra qualificada, custos legais trabalhistas, redução da produtividade e despesas relacionadas ao bem-estar social. A forma crônica, devido aos graves prejuízos cardíacos, é responsável pela perda da capacidade de trabalho e pelo extenso número de benefícios previdenciários concedidos aos pacientes [6].

 

Para fazer o diagnóstico da doença na fase aguda, a suspeita é baseada em evidências como sinais e sintomas, ou na presença de fatores epidemiológicos relevantes (como um número grande de casos confirmados na região em que o indivíduo vive ou casos confirmados em familiares e pessoas do convívio do paciente) mesmo que não haja sinais clínicos aparentes. Segundo o Guia de Vigilância em Saúde, 2017, para obter um diagnóstico laboratorial de Doença de Chagas aguda, deve-se realizar testes parasitológicos (buscando pelo parasito T. cruzi) e sorológicos (buscando por proteínas de defesa - anticorpos - que o infectado possa ter elaborado contra o parasito), pois grande número de parasitos estão circulando no sangue. Já na fase crônica indeterminada, onde a maior parte dos casos não manifesta sintomas, o contexto epidemiológico de risco e vulnerabilidade para a Doença de Chagas é essencial para a suspeita da enfermidade. Nesse caso, são realizadas duas sorologias, com métodos diferentes, visto que a concentração de parasitos no sangue é muito baixa nessa fase [3].

Nesse contexto, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) tem tentado inovar e atuar de forma generalizada, visando diagnosticar, tratar e monitorar pessoas infectadas [7]. Uma  iniciativa da Fiocruz foi a criação do “Teste Rápido Chagas – Bio-Manguinhos”, que se trata de um método de triagem para detecção de anticorpos contra o Trypanosoma cruzi. O funcionamento básico desse teste envolve a retirada de uma amostra de sangue de um indivíduo, a qual é aplicada em uma cavidade, onde há partes específicas do protozoário Trypanosoma cruzi - também chamadas de “antígenos” - que irão interagir com anticorpos específicos que o paciente elabora contra o parasito caso esteja infectado. Para facilitar essa interação, é utilizada uma substância chamada de “tampão de corrida”, que acelera o tempo do percurso da amostra no dispositivo de teste para encontrar as porções de T. cruzi e com elas interagir formando um complexo antígeno-anticorpo. Uma vez formado o complexo, o dispositivo permite a sua visualização pela produção de cor (evidência de resultado positivo), isso significa que o indivíduo teve contato com o T. cruzi [8].

Cabe destacar ainda que essa inovação na detecção de infectados está sendo aplicada no país, por meio do projeto CUIDA Chagas, que já atua em dois municípios do norte de Minas Gerais e busca testar novas formas de diagnosticar e tratar os pacientes com a doença de Chagas. Até 2025, o projeto visa testar a eficácia, eficiência e rapidez de quatro tipos diferentes de testes rápidos, entre eles o anteriormente mencionado desenvolvido pela Fiocruz. Além disso, a proposta do projeto também envolve estudo para avaliar o impacto econômico e social que a doença causa na população, propondo compreender de forma ampliada os múltiplos aspectos associados a essa doença [9], os quais não devem ser menosprezados.

Referências Bibliográficas

[1] AGÊNCIA BRASÍLIA. Período de chuvas aumenta a incidência de barbeiros. Disponível através do link: https://www.flickr.com/photos/agen ciabrasilia/39327044725. Acesso em: 05/01/2024.

[2] Garcia SB. Doença de Chagas: os 100 anos da descoberta e a atualidade do pensamento do seu descobridor. Arquivos de Gastroentero logia. 2009;46(4):249–251. Disponível através do link: https://www.scielo.br/j/ag/a/MjYZD9FGBB4FySYbqFDDHHB/. Acesso em: 05/01/2024.

[3] MINISTÉRIO DA SAÚDE. Protocolo  Clínico e Diretrizes Terapêuticas Doença de Chagas. Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. Disponível através do link: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/doenca-de-chagas/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-doenca-de-chagas-_-relatorio-de-recomendacao.pdf/view. Acesso em: 05/01/2024.

[4] Martins-Melo FR, Ramos AN, Alencar CH, Heukelbach J. Prevalence of Chagas disease in Brazil: A systematic review and meta-analysis. Acta Tropica. 2014;130:167–174. Disponível através do link: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24139912/. Acesso em: 05/01/2024.

[5]Pearson RD. Doença de Chagas. Manuais MSD edição para profissionais. Disponível através do link: https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/doen%C3%A7as-infecciosas/protozo%C3%A1rios-extraintestinais/doen%C3%A7a-de-chagas. Acesso em: 05/01/2024.

[6] Perissato IL, Santos KAR, Oliveira AMM de, Limongi JE. Doença de Chagas e a seguridade social: caracterização da doença no sistema previdenciário e assistencial brasileiro, 2004-2016. Epidemiologia e Serviços de Saúde. 2022;31(2). Disponível através do link: http://scielo.iec.gov.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-49742022000200302. Acesso em: 05/01/2024.

[7] FIOCRUZ. Fiocruz desenvolve novos kits diagnósticos para doença de Chagas. Disponível através do link: https://portal.fiocruz.br/noticia/fiocruz-desenvolve-novos-kits-diagnosticos-para-doenca-de-chagas. Acesso em: 05/01/2024.

[8] Schueler P. Teste Rápido Chagas. Disponível através do link: https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/produtos/reativos/testes-rapidos/teste-rapido-chagas. Acesso em: 05/01/2024.

[9] CUIDA CHAGAS. Cuida Chagas: Norte de Minas fará pesquisa inédita para diagnóstico da doença. Disponível através do link: https://www.agenciaminas.mg.gov.br/noticia/cuida-chagas-norte-de-minas-fara-pesquisa-inedita-para-diagnostico-da-doenca. Acesso em: 05/01/2024.

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