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"Canetas Emagrecedoras": Inovação, Riscos e Regulação no Combate à Obesidade

Gabriela Panhoca Rodrigues¹, Maria Cláudia Sanguinete Santos¹, Gabriela Vasconcelos Britto¹, Thainara Marques Morais de Oliveira², Alexandra Rodrigues Costa², Isabela Lorena dos Anjos Silva², Izabela Oliveira Carvalho², Letícia França Rocha²

¹ Graduandas do curso de Medicina (UFSJ-CCO)

² Graduandas do curso de Bioquímica (UFSJ-CCO)

v.3, n.8 2025

Agosto de 2025

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a obesidade é um dos principais problemas de saúde pública da atualidade. A estimativa é que, até 2025, cerca de 2,3 bilhões de adultos em todo o mundo estejam acima do peso, dos quais aproximadamente 700 milhões terão obesidade. No Brasil, dados do Vigitel (Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) de 2019 revelaram que a prevalência da obesidade aumentou 72% nos últimos treze anos, afetando homens e mulheres da mesma forma [1].

A obesidade, definida pelo acúmulo anormal ou excessivo de gordura, é uma doença multifatorial, isto é, causada por vários fatores em conjunto. Surge de uma combinação de aspectos físicos, psicológicos, emocionais e sociais, como a alimentação, a prática de atividade física, a forma como o corpo usa energia, além do nível de escolaridade e do ambiente em que o indivíduo está inserido [2-4]. O excesso de peso está associado a várias outras doenças, como doenças do coração, diabetes, síndrome metabólica e câncer [2]; em pacientes que sofrem com este excesso, a perda de pelo menos 5% do peso corporal inicial já costuma trazer melhorias para a saúde, e quanto maior a perda de peso, maiores tendem a ser os benefícios [2,5].

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Diante desse cenário preocupante, várias intervenções têm sido utilizadas para auxiliar no emagrecimento, como controle alimentar, prática de exercícios físicos, programas de modificação de comportamento, cirurgia bariátrica e uso de medicamentos com prescrição médica. Entre essas estratégias, os medicamentos antiobesidade têm se destacado por apresentarem altas taxas de adesão e efeitos perceptíveis a curto prazo na redução do peso corporal [6]. O tratamento com remédios é geralmente indicado quando o paciente não consegue atingir as metas de perda de peso com mudanças no estilo de vida [2,5]. Nesse contexto, existem vários medicamentos, mas os dois que têm ganhado destaque na atualidade são: a semaglutida (comercializada como Ozempic - Figura 1) e a tirzepatida (Mounjaro) - ambas conhecidas como “canetas emagrecedoras”. São usadas no tratamento de diabetes tipo 2 (DM2): condição crônica em que se tem muita glicose (açúcar) no sangue, mas o organismo não consegue utilizá-la como fonte de energia da maneira esperada. Isso ocorre por não se produzir quantidade suficiente do hormônio insulina ou por exibir-se resistência a ele (como consequência de fatores como a predisposição genética, idade avançada, excesso de peso, sedentarismo e hábitos alimentares inadequados) [7]. Além de serem indicadas no tratamento de DM2, as canetas mostram eficácia na redução de peso, tornando-se alternativas promissoras no tratamento da obesidade [8,9].

Mas como esses medicamentos podem auxiliar na perda de peso?

 

O GLP-1 é um hormônio produzido principalmente no intestino logo após as refeições. Ele ajuda o corpo a controlar os níveis de açúcar no sangue, aumentando a liberação de insulina (hormônio que reduz a glicose no sangue) e diminuindo a do glucagon (que eleva a glicose no sangue). Além disso, o GLP-1 atua em áreas do cérebro responsáveis pela saciedade, ajudando a reduzir o apetite. Outro efeito importante desta substância é o retardo do esvaziamento do estômago, prolongando a sensação de estômago cheio. Em pessoas com sobrepeso ou obesidade, a liberação natural desse hormônio costuma ser menor, o que pode prejudicar o controle do apetite e da glicose sanguínea [6].

Outro hormônio envolvido é o GIP, também produzido no intestino após a ingestão de alimentos. Ele estimula a liberação de insulina, mas, ao contrário do GLP-1, não interfere na liberação de glucagon. Estudos mostram que a ativação do receptor do GIP contribui para a perda de peso por também interferir no esvaziamento do estômago, reduzindo a ingestão de alimentos [10].

O medicamento Ozempic atua como ativador do receptor GLP-1, enquanto o Mounjaro combina a ação dos hormônios GIP e GLP-1 [5,11]. Dessa forma, esses medicamentos, conhecidos como “canetas emagrecedoras”, imitam a ação desses hormônios, auxiliando a reduzir a fome, retardando o esvaziamento do estômago e promovendo maior sensação de saciedade [6]. 

 

Atualmente, pessoas não-obesas e não-diabéticas têm feito uso desses medicamentos com fins somente estéticos, sem supervisão médica. Segundo o diretor-presidente substituto da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o uso indiscriminado apresenta riscos à saúde do usuário: “Estamos falando de medicamentos novos, cujo perfil de segurança a longo prazo ainda não é totalmente conhecido. Por isso, é fundamental o monitoramento e a vigilância. O uso sem avaliação, prescrição e acompanhamento por profissionais habilitados, de acordo com as indicações autorizadas, pode aumentar os riscos e os potenciais danos à saúde” [8].

 

Uma pesquisa canadense, realizada com indivíduos de ambos os sexos e sem diabetes, que faziam tratamento para excesso de peso ou obesidade, mostrou que o uso desses medicamentos pode aumentar o risco de inflamação no pâncreas, causar dificuldade no esvaziamento do estômago e bloqueio no intestino [12]. Por isso, cabe ao médico avaliar cuidadosamente os benefícios e riscos antes de prescrever esses medicamentos para usos diferentes dos indicados na bula, os chamados usos “off label” [8].

Assim, para evitar-se o uso indevido e não recomendado, a Anvisa estabeleceu regras mais rigorosas para a prescrição e a venda desses medicamentos. A partir de agora, a prescrição médica deverá ser feita em duas vias, e a venda só poderá ocorrer com retenção da receita na farmácia ou drogaria: procedimento semelhante ao adotado para a venda de antibióticos [8].

Referências Bibliográficas

[1] Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. Mapa da Obesidade. Disponível através do link: https://abeso.org.br/obesidade-e-sindrome-metabolica/mapa-da-obesidade/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[2] Aaseth J et al. Diets and drugs for weight loss and health in obesity – An update. Biomed Pharmacother., v. 140, p. 111789, 2021. Disponível através do link: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0753332221005710. Acesso em: 03 ago. 2025.

[3] Steptoe A Frank P. Obesity and psychological distress. Philos Trans R Soc Lond B Biol Sci., v. 378, n. 1888, p. 20220225, 2023. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10475872/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[4] Williams EP et al. Overweight and Obesity: Prevalence, Consequences, and causes of a growing public health problem. Current Obesity Reports, v. 4, p. 207–216, 2015. Disponível através do link: https://link.springer.com/article/10.1007/s13679-015-0169-4. Acesso em: 03 ago. 2025.

[5] Chao AM et al. Semaglutide for the treatment of obesity. Trends Cardiovasc Med., v. 33, n. 3, p. :159–166, 2021. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9209591/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[6] Wang JY, et al. GLP-1 receptor agonists for the treatment of obesity: role as a promising approach. Front Endocrinol (Lausanne), v. 14, p. 1085799, 2023. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9945324/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[7] Brasil. 2020. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Diabete Melito Tipo 2. Disponível em: https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/protocolos/20201113_pcdt_diabete_melito_tipo_2_29_10_2020_final.pdf. Acesso em: 03 ago. 2025.

[8] Ministério da Saúde (BR) - Medicamentos agonistas GLP-1 só poderão ser vendidos com retenção da receita. Disponível através do link: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2025/canetas-emagrecedoras-so-poderao-ser-vendidas-com-retencao-de-receita. Acesso em: 03 ago. 2025.

[9] Pandey A et al. Estimating the lives that could be saved by expanded access to weight-loss drugs. Proc Natl Acad Sci USA, v. 121, n. 43, p. e2412872121, 2021. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC11513960/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[10] Sinha R et al. Efficacy and Safety of Tirzepatide in Type 2 Diabetes and Obesity Management. J Obes Metab Syndr., v. 32, n. 1, p. 25-45, 2023. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10088547/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[11] Aronne LJ et al. Continued Treatment With Tirzepatide for Maintenance of Weight Reduction in Adults With Obesity. JAMA, v. 331, n. 1, p. 38-48, 2023. Disponível através do link: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC10714284/. Acesso em: 03 ago. 2025.

[12] Sodhi M et al. Risk of gastrointestinal adverse events associated with glucagon-like peptide-1 receptor agonists for weight loss. JAMA, v. 330, n. 18, p. 1795–1797, 2023. Disponível em: https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC10557026/.  Acesso em: 03 ago. 2025.

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