
Células-Tronco Embrionárias: o que são, principais características e funções
Priscila Oliveira Tavares¹, Carolina Alves De Oliveira Gotelip¹, Larissa Gabrielle Batista Ferreira¹, Lara Letícia de Sena Moreira¹, Lívia Sofia Faria Aleixo², Carolina Souza Rabelo Ferreira², Renata Monteiro Alves Costa³, Giovanna Carolina Mendes Barbosa³
¹ Graduandas do curso de Bioquímica (UFSJ-CCO)
² Graduandas do curso de Enfermagem (UFSJ-CCO)
³ Graduandas do curso de Farmácia (UFSJ-CCO)
v.3, n.6, 2025
Junho de 2025
As células-tronco embrionárias, como o próprio nome sugere, correspondem às células originadas no embrião após a fecundação dos gametas (espermatozóide e ovócito - popularmente conhecido como óvulo). O processo em que são geradas se dá por sucessivas divisões celulares, as quais estão distribuídas em várias etapas. Em vista disso, considerando um embrião humano que irá se desenvolver durante a gestação (gravidez), tem-se que essas unidades em breve se especializarão em tecidos específicos com suas devidas particularidades e funções [1]. Sendo assim, essas células são possuem capacidade de se tornarem qualquer tipo de célula existente no organismo [2]. Devido a essa propriedade, sua importância para a ciência é significativa, haja vista que podem impactar em diversas condições de saúde que antes eram dadas como incontornáveis.
Existem quatro tipos de células-tronco quanto à origem (local de onde podem ser obtidas): adultas, do cordão umbilical, fetais e embrionárias. A maior diferença entre elas é a capacidade proliferativa e sua potencialidade (possibilidade) de diferenciação para originar novos tipos celulares. Partindo disso, tem-se que o grupo das embrionárias é o de maior potencialidade, pois pode se transformar no mais amplo número de diferentes tipos de células. Os demais grupos, embora todos sejam de células-tronco, já possuem uma função e um destino pré-definidos no organismo humano, tendo possibilidade de transformação em número mais limitado de tipos de células diversas [2,3].
Outra interessante característica das células-tronco é a capacidade de manter a informação genética (presente no núcleo das células na estrutura do ácido desoxirribonucleico (DNA)). Frequentemente, durante a vida, o DNA sofre danos ocasionados por erros na maquinaria da célula e outros fatores relacionados a doenças e estilo de vida, por exemplo [4]. Logo, é necessário efetuar reparos para reverter esses danos e manter a estabilidade genética (manter a integridade da informação). Nesse contexto, como reação a esses diversos agentes que causam danos ao DNA, as células-tronco embrionárias humanas possuem maior eficácia na reparação do DNA em comparação com as demais células do organismo humano. Isso acontece porque as células-tronco embrionárias possuem mais estruturas responsáveis por esta correção do DNA: as proteínas de reparo.

Figura 1: Divisão do embrião e células tronco.
Fonte: https://hwrhsgeneralconsensus.com/wp-content/uploads/2021/04/ff037440-2181-42a2-a8cf-2e55405674dc-900x343.jpg
Além disso, tais células, em comparação com as células não tronco, apresentam um número reduzido de estruturas denominadas mitocôndrias. Estas estruturas são importantes na obtenção de energia pelas células, mas podem também produzir moléculas nocivas, como por exemplo, as espécies reativas de oxigênio (ditas radicais livres), ou seja, podem reagir com o DNA nuclear, proteínas e estruturas do envoltório da célula causando prejuízos. Com relação à obtenção de energia, as células-tronco utilizam o açúcar glicose, principalmente, o que por consequência já produz níveis mais baixos dos radicais livres mencionados. Soma-se a isso o fato de que as células-tronco embrionárias também serem capazes de produzir mais substância que combatem as espécies reativas de oxigênio: os antioxidantes [5]. Esses são exemplos de fatores determinantes para justificar a distinção das células tronco embrionárias, destacando sua natureza ímpar.
Outro ponto relevante a ser discutido refere-se ao uso dessas unidades biológicas para fins terapêuticos, principalmente no sentido de regeneração, assim como ocorre com a cauda dos lagartos. Em momentos posteriores a uma amputação em sua cauda, células localizadas ao redor dos tubos neurais (povoados por células-tronco) respondem a sinais para se proliferarem e se diferenciarem (se transformarem) em tecidos da cauda [6]. Processos semelhantes podem acontecer na reconstituição de tecido cardíaco em pacientes que sofreram infarto, ou até mesmo, conforme avançam os estudos, no tratamento de Alzheimer. Além disso, também existem pesquisas com as células-tronco embrionárias na reconstituição dentária, na regeneração de tecido renal, no tratamento da diabetes, na produção de vacinas contra o câncer de pulmão, dentre outras aplicações [7].
Ao levar em conta esses fatores, faz-se interessante destacar uma terapia que atualmente ainda é bastante desconhecida pelas pessoas: células-tronco como possível tratamento para o “Mal de Parkinson”. A doença de Parkinson é neurodegenerativa (causando morte de células chamadas de neurônios), caracterizada por tremores que em estágios avançados provocam quedas e falta de equilíbrio para manter a postura. Esses sintomas e sequelas decorrem da perda progressiva de neurônios dopaminérgicos (neurônios que dependem da utilização de uma substância chamada dopamina para se comunicarem com outras células). Isto ocasiona, consequentemente, redução significativa nos níveis de dopamina (estrutura sinalizadora importante para execução dos movimentos físicos) disponíveis. Estudos investigam o potencial das células-tronco na geração de novos neurônios dopaminérgicos, restaurando as quantidades esperadas de produção do sinalizador mencionado. Todavia, é importante ressaltar que intervenções no sistema nervoso central são sempre delicadas e complexas, exigindo cuidado, muitas pesquisas prévias e constante aprimoramento [8,9].
Embora em pesquisas anteriores o desempenho dessa terapia para o tratamento de Parkinson tenham mostrado ressalvas sendo considerado arriscado quando visualizado em modelos animais, o artigo ‘Floor plate-derived dopamine neurons from hESCs efficiently engraft in animal models of PD’ (Neurônios dopaminérgicos derivados da placa de assoalho de hESCs são enxertados com eficiência em modelos animais de DP) apresentou resultados animadores e que pontuam sobre as melhores condições para realizar procedimentos bem sucedidos [10,11].
O principal experimento realizado envolveu o cultivo das células-tronco embrionárias sob a influência de sinais que ocorrem naturalmente nas células dopaminérgicas. Dessa forma, houve uma indução para especializar tais unidades biológicas. Após isso, as células passaram por um processo de maturação, ficando em ambiente com condições específicas semelhantes ao local para o qual seriam transplantadas no corpo do receptor. Finalmente, após mais estudos sobre essas células, elas foram enxertadas em uma parte específica do cérebro. Isso se deu através de cirurgia e injeção. No estudo abordado, foram efetuados testes em camundongos e macacos que comprovam a diferenciação direcionada de células-tronco embrionárias em neurônios dopaminérgicos, como desejado [11].
Por fim, vale ressaltar que a relação entre questões éticas, morais e as pesquisas que envolvem células-tronco embrionárias é polêmica e constantemente representa alvo de discussões intensas. No Brasil existe a Lei Federal 11.105, que estabelece condições e limites para o uso de tais unidades biológicas em fins terapêuticos. Neste sentido, primeiramente, as células devem ser obtidas de embriões humanos inviáveis produzidos por fertilização in vitro (artificialmente) e que tenham permanecido congelados por mais de três anos. Além disso, o consentimento dos genitores (doadores do material para a fertilização in vitro) deve ser priorizado e uma documentação deve ser enviada para comitês de ética em pesquisa para a devida aprovação [12].
Portanto, o uso de células-tronco representa um avanço tecnológico e científico. Dessa forma, inúmeras descobertas podem ser feitas na tentativa de melhorar as condições de vida dos seres humanos e sua qualidade de vida perante doenças que configuram declínio físico, psicológico e vital. Todavia, para evitar problemas ainda mais graves do que a saúde do indivíduo, faz-se necessário pesquisas científicas sólidas, com metodologias e resultados bem consolidados, passíveis de reprodução segura. Para isso, é necessário investimento e popularização do conhecimento, bem como uma estrutura favorável para ambos.
Referências Bibliográficas
[1] Biswas A, Hutchins R. Embryonic stem cells. Stem cells and development, v. 16, n. 2, p. 213-222, 2007.
[2] Ohnuki M, Takahashi K. Present and future challenges of induced pluripotent stem cells. Philosophical Transactions of the Royal Society B: Biological Sciences, v. 370, n. 1680, p. 20140367, 2015.
[3] Rocha AS et al. Considerações sobre Células-Tronco Embrionárias. Veterinária e Zootecnia, v. 19, n. 3, p. 303-313, 2023.
[4] Alberts B et al. Molecular Biology of the Cell. 6th ed. New York: Garland Science; 2014.
[5] Fu X et al. DNA repair mechanisms in embryonic stem cells. Cellular and Molecular Life Sciences, v. 74, n. 3, p. 487-493, 2016.
[6] Lozito TP et al. Introducing dorsoventral patterning in adult regenerating lizard tails with gene-edited embryonic neural stem cells. Nature Communications, v. 12, n. 1, p. 10578, 2021.
[7] Pranke P. A importância de disvutir o uso de células-tronco embrionárias para fins terapêuticos. Ciência e Cultura, v. 56, n. 3, p. 33-38, 2025.
[8] Stoker TB. Stem Cell Treatments for Parkinson’s Disease [Internet]. Stoker TB, Greenland JC, editors. PubMed. Brisbane (AU): Codon Publications; 2018. Disponível através do link: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/30702846/. Acesso em: 05 jun. 2025.
[9] Waninger S et al. Neurophysiological Biomarkers of Parkinson’s Disease. Journal of Parkinson’s Disease, v. 10, n. 2, p. 471-480, 2020.
[10] Lindvall O, Kokaia Z. Stem cells in human neurodegenerative disorders — time for clinical translation? Journal of Clinical Investigation, v. 120, n. 1, p. 29-40, 2010.
[11] Kriks S et al. Dopamine neurons derived from human ES cells efficiently engraft in animal models of Parkinson’s disease. Nature, v. 480, n. 7378, p. 547-551, 2011.
[12] Takeuchi CA, Tannuri U. A polêmica da utilização de células-tronco embrionárias com fins terapêuticos. Revista da Associação Médica Brasileira, v. 52, n. 2, p. 63, 2006.